A
guerra despertou, desde os seus primórdios, sentimentos que o Homem não sabia
existirem. O sangue dos inocentes marcou as páginas de livros que desapareceram
para sempre. Com estes, foram esquecidos os que não pediram a guerra e foram
levados por ela. Os feitos dos heróis são enaltecidos, revelam-se todos os
episódios de maior importância. E os outros? Quem são os outros? São aqueles
que ninguém recorda, que não enchem parte alguma dos compêndios de História.
São os que deram as suas vidas pela vida de alguém que não tinham de defender.
Mas fizeram-no. Lutaram até ao fim e, apesar disso, permanecem apenas na
memória de alguns, são uma outra espécie de soldados desconhecidos.
No entanto, não existe a necessidade
de falar sobre a guerra de um modo pesaroso. Podemos transmitir aos nossos
descendentes, de
um modo natural e humano, a crueldade que os antepassados criaram pelos mais
diversos motivos. Com um esforço quase hercúleo talvez seja possível mudar o
mundo ou, pelo menos, mudar as mentalidades dos que nele habitam.
É também necessário que haja
respeito entre os indivíduos. Sem ele, mais conflitos vão começar: guerras sem
espingardas, canhões, espadas ou varapaus; guerras em que as liberdades são
colocadas de lado, onde não se respeitam os limites e não se põe em prática o
ideal de amor ao próximo; contendas provocadas pela religião, por diferentes
ideologias e pela esperança vã de que estas conduzam a algo melhor.
Podemos, então, falar numa certa
Utopia. É aí, nessa ilha onde tudo parece melhor, que a glória conseguida na
guerra é considerada vergonhosa. O Homem, no mundo real – ou num universo
poético e negro – afirma que a sua glória é criar desumanidade. É humano ser
desumano. Toda esta revolta e ambição corre-nos nas veias: queremos chegar mais
longe, mesmo que para
isso seja necessário derrubar o que encontramos pelo caminho, numa espécie de
efeito dominó.
Apesar de tudo, resta a certeza de
que estes comportamentos negativos servem de modelo para aquilo que devemos, a
todo o custo, evitar. Ainda estamos a tempo de mudar. Podemos
escrever um novo final para esta história. Podemos honrar os antepassados,
aqueles que morreram por uma causa e não são lembrados. Temos a obrigação de
amar como eles não tiveram oportunidade de amar; temos mais uma hipótese de
restabelecer a paz no meio de tantas batalhas e, deste modo, restaurar uma
ínfima parta da felicidade que escapou aos fantasmas do passado, que vagueiam
pelos dias de hoje numa tentativa de nos transmitir que até a miséria existente
no coração humano tem algo para nos ensinar.